1
[Liverpool, 6 ou 7 de Maio, 1916]
Queridos pais,
Após inúmeras dificuldades finalmente cheguei em Liverpool. Meu barco deverá sair daqui a três dias, o que me forçou a mandar este postal para vocês. A empresa pagará o postal depois de uns dias.
Eu ainda estou sobre pressão e mandarei notícias em breve.
Afetuosamente, Louis
2
[Liverpool, tarde de domingo - Maio 7, 1916]
Minha querida Simone,
Ser forçado a passar o domingo em Londres já é motivo suficiente para um desastre, mas rapidamente se torna uma catástrofe quando as circunstâncias o obrigam a passa-lo em Liverpool.
Você nunca poderia imaginar um lugar tão repugnante, tão imundo e tão religioso.
No entanto, por volta das 6 horas da tarde, possivelmente pela alegria ansiosa de ver este dia chegar ao fim, as diferentes seitas Protestantes saíram de seus retiros, folhetos voando, circulando por todas as direções da cidade ao som de hinos, que, devido às circunstâncias, davam uma vaga sensação de marcha militar.
Eles, então, finalmente, se estabeleceram em diversas praças para continuar com mais ardor do que nunca o agradecimento ao Senhor por ter fodido todos nós.
Eu tenho sido indiferente para este tipo de manifestação, mas estes de Liverpool são bastante peculiares, devido ao incalculável número de estivadores que compõem o estoque antigo da população que esperam o bar abrir as 8:30h e então matam a sede ao som de música sacra.
Verdadeiros profissionais, eles se espalham entre os crentes, contribuindo consideravelmente para a ressonância se não pela piedade - eu vi um, logo atrás de mim, que avidamente iniciou um Hino à Virgem no qual as virtudes físicas e morais desta eram repetidamente louvadas e então apareceu o adjetivo "bela", que ofereceu a oportunidade de sublinhar a palavra ao contemplar uma mulher perto dele, que parecia ter bastante conteúdo para apropriar-se dos atributos originais destinados para a mãe de Deus - que, como você pode ver, constitui um sentido ambíguo e angustiante.
Seu sincero,
Des Touches
3
[Telegrama aos pais] [Liverpool, quarta-feira, Maio - 10, 1916]
Embarco hoje: Destouches.
4
Serra Leoa [ Freetown, 25 de Maio, 1916]
Querido Pai,
Nos últimos três dias eu fui pego por uma febre violenta - envie de minha conta-poupança 1.000 francos. Trabalharei com qualquer coisa em Paris para te pagar de volta, mas eu não posso ficar aqui, eu ainda estou em Duala. Escreva-me.
Afetuosamente, Louis
C.F.S.O. Duala-
5
[Cartão postal para seu pai] [Freetown, 27 de maio, 1916]
Não diga nada à mãe. Irei mandar outro cartão postal para casa.
Essa febre violenta. Envie dinheiro para minha conta no Banco da África Equatorial. Não tocarei no dinheiro se conseguir aguentar. Perdoe-me, não é minha culpa. Dois mortos a bordo.
Louis
6
[Cartão postal para seu pai] [Freetown, 27 de maio, 1916]
Terrível calor.
Louis
7
[Cartão postal para seu pai] [Freetown, 27 de maio, 1916]
-está muito calor
Um cruzamento muito ruim
Com amor,
Louis
8
[Cartão postal para seu pai] [Freetown, 27 de maio, 1916]
Em quarentena.
L Des Touches.
9
[Cartão postal para Simone Saintu] [Freetown]
Estamos em quarentena.
Inferno.
Melhores votos,
Louis-
10
[S.S. Accra-Lagos, 02 de junho de 1916]
Meu caro Milon-
A experiência é conclusiva - Absolutamente não há futuro aqui, e não por falta de oportunidade comercial mas como resultado das condições climatéricas que são pura e e simplesmente abomináveis - Os Europeus consomem uma variedade enorme de alimentos, em parte devido aos excessos, mas também pelas situação sanitária. Qualquer vida saudável é impossível e só apenas com o custo de sua saúde que se consegue fazer algo aqui - Eu mesmo sofri um ataque abrupto de febre em Serra Leoa e não irei durar muito na África... nós iremos para Duala amanhã. Lá ficarei um ou dois meses para reparar os aspectos onerosos desta pequena experiência, tanto quanto possível - Se coloque em meu lugar e me deixe saber como as coisas estão. Se você souber de alguma oportunidade em Paris não se esqueça de mim.
A região é excessivamente rica e, incontestavelmente aberta para um grande futuro. Não há esperança para quem quer manter sua saúde num estado tolerável.
Nada mais triste do que os rostos amarelos destes colonialistas. Apáticos, parecem consumidos pelos destroços de uma febre triste - e a vida lentamente os engole, como se fossem absorvidos por um sol que afoga tudo e infalivelmente mata tudo que tenta resistir.
Escreva para mim logo, não para a minha casa mas no endereço abaixo.
Louis des Touches
Elder Dempster Agency
Duala (Camerões)
África
11
[Cartão postal para seu pai] [Lagos, 5 de Junho, 1916]
Deixando Duala, me sentindo um pouco melhor agora - ainda está muito quente
Louis-
12
[Cartão postal para Simone Saintu] [Lagos, 5 de junho, 1916]
Não é belo. Triste.
Louis-
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013
sábado, 23 de fevereiro de 2013
Férias assaltadas, por Céline
Eu posso ver o clown em "O Gangster que pula fora". Eu sei muito pouco sobre ele, mas ele me parece estar bem apropriado para o trabalho.
Um fiscal de impostos vê uma montanha de dinheiro de passagem: ele está apaixonado... ele é desprezado...
isso o desagrada... Ele vai para o Hipódromo. Ele perde... ele vai para o cinema... ele vê Chicago... ele espera pelas férias... "Férias assaltadas"... é como eu chamo. E lá vai ele, pela estrada... ele alugou um Rosengart, 1.500 francos por mês... Ele vai parar algumas limousines... eles irão saber o que ele quer... eles oferecem ajuda... eles percebem... para a Trou-Le-Ville. No Cassino, ele perde o controle. Ele tenta apostar a casa num jogo de baralho... mas ele parece muito honesto... eles se recusam a deixá-lo para trás, lá dentro... ele rouba um cone de sorvete de morango... ele é profundo... Etc, etc. Ele termina com honestidade... impostos. Então, seu tio morre. Está tudo arranjado. Ele vai comprar o Rosengart em dezoito parcelas.
Mas eu, eu não tenho o necessário. Ainda assim, esse é o caminho a percorrer.
terça-feira, 12 de fevereiro de 2013
Poemas de Céline
Gnomographia
Istambul dorme sob a lua pálida
O Bósforo cintila com mil chamas prateadas
Sozinho na grande cidade Maometana
O velho pregoeiro ainda não dormiu -
Sua voz repercute e é amplificada pelo eco
Anunciando para a cidade que já são 10 horas
Mas através da janela, do alto de seu minarete
Seu olhar inquieto mergulha num quarto
Por um momento permanece, em silêncio, preso pela surpresa
Ele acaricia nervoso a sua grande barba cinza
Mas, fiel ao dever, ele equilibra a voz
E então o eco atônito se repete três vezes
Para a lua enrubescida, para as estrelas deslumbrantes
Para Istambul - A Branca - em breve será meio-dia.
Ngobonbong,
Augusto 28, 1916.
O grande Carvalho
Mas já, lentamente, o céu está caindo.
Os raios ocidentais, perseguidos pela noite
Lutam contra a escuridão, e resistem novamente
Velando o recuo do sol que foge
Acima da rocha negra que encobre a floresta
Como o orvalho que ainda mantém a luz decrescente
Enquanto isso, pouco a pouco, a sombra levanta e leva embora
E mergulha, por sua vez, no Todo perturbado
Cada hora de nossa vida traz sua sombra
Afugentando a esperança, que nunca irá retornar
As ilusões perdidas, a amargura crescente
Invade nosso coração, destruindo-o e matando-o -
Bikobimbo,
Augusto 30, 1916.
O Presidente Vincent Auriol
Hey, veja o Presidente
Este é um destino muito trágico
Ele é bem pago, ele vive no Palácio do Presidente
Ele começou sua Carreira numa campanha feroz
Contra a Pena de Morte.
Ele era um Anarquista
E agora ele é Presidente
Nenhum Presidente assinou tantos perdões.
Há fantasmas que rondam o Palácio, lhe asseguro
Arrastando seus postos de Execução
E a retórica do Presidente.
Imaginem acabar assim!
Ele não pode fazer nada sobre isso, é assim que é...
Este é o Destino
Esses são os desafios
Ele é um homem corajoso
Ele deve assinar
Ou morrer.
1949.
Istambul dorme sob a lua pálida
O Bósforo cintila com mil chamas prateadas
Sozinho na grande cidade Maometana
O velho pregoeiro ainda não dormiu -
Sua voz repercute e é amplificada pelo eco
Anunciando para a cidade que já são 10 horas
Mas através da janela, do alto de seu minarete
Seu olhar inquieto mergulha num quarto
Por um momento permanece, em silêncio, preso pela surpresa
Ele acaricia nervoso a sua grande barba cinza
Mas, fiel ao dever, ele equilibra a voz
E então o eco atônito se repete três vezes
Para a lua enrubescida, para as estrelas deslumbrantes
Para Istambul - A Branca - em breve será meio-dia.
Ngobonbong,
Augusto 28, 1916.
O grande Carvalho
Mas já, lentamente, o céu está caindo.
Os raios ocidentais, perseguidos pela noite
Lutam contra a escuridão, e resistem novamente
Velando o recuo do sol que foge
Acima da rocha negra que encobre a floresta
Como o orvalho que ainda mantém a luz decrescente
Enquanto isso, pouco a pouco, a sombra levanta e leva embora
E mergulha, por sua vez, no Todo perturbado
Cada hora de nossa vida traz sua sombra
Afugentando a esperança, que nunca irá retornar
As ilusões perdidas, a amargura crescente
Invade nosso coração, destruindo-o e matando-o -
Bikobimbo,
Augusto 30, 1916.
O Presidente Vincent Auriol
Hey, veja o Presidente
Este é um destino muito trágico
Ele é bem pago, ele vive no Palácio do Presidente
Ele começou sua Carreira numa campanha feroz
Contra a Pena de Morte.
Ele era um Anarquista
E agora ele é Presidente
Nenhum Presidente assinou tantos perdões.
Há fantasmas que rondam o Palácio, lhe asseguro
Arrastando seus postos de Execução
E a retórica do Presidente.
Imaginem acabar assim!
Ele não pode fazer nada sobre isso, é assim que é...
Este é o Destino
Esses são os desafios
Ele é um homem corajoso
Ele deve assinar
Ou morrer.
1949.
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